STJ discute se procurador pode assessorar ministro
09 de julho de 2013O Superior Tribunal de Justiça vai discutir se os ministros da 1ª Seção que têm procuradores da Fazenda Nacional em seus gabinetes estão ou não impedidos de atuar em casos tributários de interesse da União. A questão está posta em Exceção de Suspeição ajuizada pela empresa de incorporações imobiliárias Inajá. O caso está no STJ desde março deste ano, sob relatoria da ministra Eliana Calmon.
De acordo com o pedido da Inajá, subscrito pelo advogado Frederico de Moura Theophilo, os ministros Mauro Campbell, Humberto Martins, Herman Benjamin e Villas Bôas Cueva têm em seus gabinetes, como assessores, procuradores da Fazenda Nacional. Os três primeiros ministros da lista atuam na 2ª Turma do STJ, que faz parte da 1ª Seção, que só julga matérias de Direito Público. Entre elas, as questões que discutem tributos federais, nas quais a União é parte.
Theophilo lista em seu pedido que o procurador Adriano Falcão Neri trabalha no gabinete de Humberto Martnis, Christiano Mendes Wolney Valente está no gabinete de Mauro Campbell e Marcellus Sganzerla é assessor do gabinete de Herman Benjamin. As informações foram obtidas pelo advogado no Portal da Transparência, do governo federal.
Segundo a petição da Inajá, “no mínimo é extremamente esquisita esta cessão de procuradores da Fazenda Nacional como assessores de ministros da 2ª Turma da 1ª Seção do STJ”. De acordo com as contas da empresa, na 2ª Turma, apenas os ministros Castro Meira e Eliana Calmon não têm procuradores em seus gabinetes. “Se isso não for ilegal é, no mínimo, imoral”, escreveu a empresa.
Opiniões vinculadas
A mesma discussão acontece no Conselho Nacional de Justiça. Lá, a Ordem dos Advogados do Brasil reclama da cessão de procuradores a gabinetes de juízes federais no Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Na corte em questão, o gabinete do juiz federal Theophilo Antonio Miguel Filho tinha como assessora a procuradora da Fazenda Nacional Patrícia de Seixas Lessa. Liminar do conselheiro Lucio Munhoz, há duas semanas, determinou que Patrícia deixe o gabinete de Theophilo Antonio até que o CNJ defina a questão. O TRF-2 já afastou a procuradora do cargo.
O problema foi vinculado à discussão da mineradora Vale. A companhia discute a cobrança de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre Lucro Líquido sobre os ganhos de companhias estrangeiras coligadas ou controladas por ela. O TRF-2 decidiu em favor do fisco federal, e a recalmação foi justamente a de que o relator da matéria é assessorado por uma procuradora da Fazenda.
Responsabilidade total
O ministro Mauro Campbell não parece se incomodar com as alegações. Por telefone, explicou à revista Consultor Jurídico que tem oito assessores técnicos, além do chefe de gabinete. E deles, apenas um é procurador da Fazenda Nacional. "Meu assessor é meu assessor. Todos os votos e decisões que profiro são minhas e assumo total responsabilidade por elas. Não delego nenhuma atividade jurisdicional a qualquer assessor, não importa sua procedência", afirmou.
Campbell contou que as questão são definidas sempre por ele. O trâmite normal é que o caso chegue ao gabinete e vá para um assessor, que elabora um relatório técnico, com todas as questões tratadas no pedido e o encaminha ao ministro. Ele, então, com base na jurisprudência do tribunal, na doutrina e em sua convicção, determina: "A solução é esta". "O meu assessor não vai conduzir minha opinião. Ao contrário. Afirmar isso é apequenar a figura do juiz", disse.
Caso concreto
Apesar de o STJ poder definir a questão nesse caso, a Exceção de Suspeição diz respeito especificamente a um caso concreto. É uma discussão a respeito do desconto na taxa Selic para empresas inscritas no programa de parcelamento tributário chamado Refis da Crise. A regra, criada pela Lei 11.941/2009, dá descontos nos juros de mora e nas taxas de correção a empresas que parcelarem suas dívidas tributárias, mas implica que elas desistam de discussões judiciais a respeito dos tributos. Para os contribuintes que pagam à vista, o Refis da Crise prevê desconto de 45% na taxa Selic incidente sobre a quantia devida.
O que está posto para o STJ definir é uma regra da Fazenda Nacional que veda o desconto na Selic a contribuintes que fizeram depósito em juízo das dívidas tributárias que. A Inajá é uma dessas empresas. Optou pelo pagamento à vista, nos moldes do Refis da Crise, mas havia depositado a quantia enquanto discutia na Justiça.
A discussão começou porque o ministro Mauro Campbell afetou um Recurso Especial pelo sistema dos recursos repetitivos, descrito no artigo 543-C do Código de Processo Civil. É um rito processual pelo qual o tribunal, ao perceber que determinada questão é tratada em diversos recursos, escolhe um deles — possivelmente o mais representativo da matéria — e o julga. O resultado desse julgamento é aplicado a todos os demais casos em trâmite na Justiça.
Depois que o ministro Campbell afetou esse REsp, definiu que as empresas que depositaram em juízo e participam do Refis da Crise não têm direito ao desconto na Selic. Só as empresas que não depositaram a quantia em contas judiciais é que podem ter o desconto.
A suspeição
A Inajá reclama que a decisão de afetar o recurso pelo mecanismo dos recursos repetitivos foi autoritária, sem fundamentação, e monocrática. Frederico Theophilo afirma que um ministro, sozinho, decidiu afetar determinado caso e dizer que ele era o paradigma daquela matéria. Ele alega que o ministro, além de ter decidido sozinho, o faz sem demonstrar quais são os outros recursos que discutem as mesmas teses ou que fazem os mesmos pedidos. “E justamente esse ministro é assessorado por um procurador da Fazenda”, completa o advogado.
O mecanismo dos recursos repetitivos foi criado Lei 11.672, que acrescenta o artigo 543-C ao Código de Processo Civil. E o dispositivo afirma que o relator, se entender que determinada matéria é representativa de controvérsia que chega com frequência ao STJ, "afetará" o recurso como representativo do sistema dos recursos repetitivos.
“O que se levanta é a proximidade, a intimidade do relacionamento diário e constante de um advogado da União, um procurador federal e um procurador da Fazenda Nacional com este magistrado. Somente por isso, diante do fato de que o advogado da parte que litiga contra a União não goza desta proximidade e diante do fato de que tais servidores trazem consigo toda uma posição jurídica em defesa da União, já se instala a ofensa ao princípio da igualdade processual”, escreve Theophilo na petição ao STJ.
Contra a decisão, a Inajá apresentou Embargos de Divergência, citando que há outros julgados do STJ, inclusive de relatoria do ministro Mauro Campbell, que definiram a questão de maneira diferente. É nesses embargos que a Inajá alega a suspeição dos ministros. Como os três ministros têm procuradores da Fazenda em seus gabinetes, sua participação no julgamento dos Embargos de Divergência poderia afetar a decisão em favor da União.
FONTE:OAB/RJ
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